Se você ficou impressionado com a reentrada do satélite desgovernado UARS na última semana, então se prepare. Pelo menos 45 pedaços de satélites e restos de foguetes deverão retornar à Terra nos próximos 60 dias, incluindo um satélite alemão de 2.4 toneladas que deverá resistir ao calor da reentrada.
De acordo com dados do Comando estratégico dos EUA, (USStratcom), somente neste mês de setembro de 2011 cinco reentradas já foram observadas, entre elas a de três satélites: Uars, Cosmos 2388 e Hawksat1. Os outros dois objetos eram restos de foguetes propulsores. Dos 45 objetos que deverão reentrar na atmosfera nos próximos 60 dias, 13 são fragmentos restantes da colisão entre o satélite americano Iridium 33 e o russo Cosmos 2251, ocorrida em fevereiro de 2009 em pleno espaço. A maior parte do lixo é composta de restos de foguetes propulsores que foram usados para colocar objetos em órbita e que agora estão retornando à Terra.
Além desses fragmentos, a lista também contempla dois satélites de pesquisa: o pequeno Polysat, da Universidade Politécnica da Califórnia e o telescópio alemão de raios-x ROSAT. Enquanto o Poylsat CP6 não passa de um cubo de 10 centímetros que deverá ser incinerado durante a reentrada, prevista para 6 de outubro, Rosat é um grande equipamento de 2.4 toneladas e que segundo seus construtores, deverá resistir à reentrada.
Desde o início do ano, 269 satélites ou restos espaciais já retornaram à Terra, o que dá uma média de um objeto por dia rompendo nossa atmosfera. Desses, 13 eram satélites e 66 consistiam de fragmentos da colisão entre os satélites Iridium 33 e Cosmos 2251. Por ano, cerca de 80 toneladas de material espacial retornam à Terra.
Rosat
Além do UARS, que reentrou sobre o Pacífico em 24 de setembro, o satélite Rosat também deverá chamar a atenção nos próximos dias. Apesar do UARS ter o dobro da massa do Rosat, sua construção facilitou a ruptura dos componentes, provocada pelas altas temperaturas encontradas na fase da reentrada.
No caso do ROSAT, acredita-se que um total de 1.6 toneladas de fragmentos deverá resistir à reentrada, já que são formadas por vidro e fibra de carbono, altamente resistentes ao calor. Por ser um telescópio, a principal peça é o espelho primário, com peso aproximado de 400 quilos. Após reentrarem, essas peças cairão em queda livre, à velocidade de 450 km/h.
ROSAT tem órbita inclinada em 52 graus, muito parecida com a do UARS. Assim, o satélite deverá cair entre as latitudes 52.00N e 52.00S, com o Brasil novamente na rota dos destroços.
Os primeiros cálculos mostram que o satélite deverá reentrar na atmosfera no dia 11 de outubro, mas a exemplo do que ocorreu com o UARS essa data deverá mudar à medida que novos dados do fluxo solar sejam inseridos nos modelos de decaimento.
Quando foi colocado em órbita, em 1990, Rosat mantinha a altitude nominal de 580 km. Em julho de 2011 esse valor já era de 315 km e agora em setembro o satélite já está a 230 km acima do nível do mar.
Lixo espacial
A colisão entre um satélite russo e outro americano em meados de fevereiro de 2009 reacendeu o debate sobre os riscos do acúmulo de lixo espacial para a humanidade. Desde o lançamento do Sputnik, o primeiro objeto a entrar em órbita, em 1957, a evolução tecnológica permitiu que naves, foguetes e outras centenas de satélites explorassem o espaço tranquilamente. Após perderem a utilidade, porém, esses objetos permaneceram no mesmo local e passaram do status de exploradores para o de poluidores espaciais. Atualmente, cerca de 17.000 destroços com mais de 10 centímetros giram em torno do Planeta Terra, provocando colisões e danificando naves (na imagem acima, uma montagem feita em computador mostra o acúmulo do lixo ao redor do planeta). Saiba as consequências disso e quais são as possíveis soluções para a realização de uma “faxina no espaço”.
1. O que é lixo espacial?
O lixo espacial é composto detritos de naves, combustíveis, satélites desativados, lascas de tinta, combustível, pedaços de mantas térmicas e foguetes, objetos metálicos e até mesmo ferramentas perdidas por astronautas durante as suas explorações espaciais. “O que existe é uma grande nuvem de objetos dos mais variados tamanhos e pesos, desde um grama até toneladas”, explicou Petrônio Noronha de Souza, chefe do laboratório de Integração e Testes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
2. Quando surgiu? Como está a situação atualmente?
O grande precursor do acúmulo de detritos no espaço foi o Sputnik, o primeiro satélite artificial da Terra, lançado em 1957 pela antiga União Soviética. Hoje em dia, com a evolução tecnológica, há cerca de 800 satélites ativos em órbita. Enquanto isso, segundo o chefe do laboratório do Inpe, a órbita se tornou um “vasto lixão espacial”. De acordo com dados divulgados em 2008 pela Nasa, a agência espacial americana, foram contabilizados no espaço aproximadamente 17.000 destroços acima de 10 centímetros, 200.000 objetos com tamanho entre 1 e 10 centímetros e dezenas de milhões de partículas menores que 1 centímetro.
3. Então a evolução tecnológica só serviu para “poluir” o espaço?
Não necessariamente. Para Souza, a contrapartida da sujeira produzida pela evolução da tecnologia foi o benefício que ela trouxe para sociedade. “Não podemos dizer que tudo é lixo e apenas nos causa mal. Tudo que está lá sempre teve um propósito, nada foi colocado só para poluir. O lixo acumulado é um preço que se paga em função de um beneficio adquirido”, lembra ele.
4. O que acontece com os detritos que ficam no espaço e ninguém retira?
Nem tudo o que foi colocado no espaço permanece em órbita. Souza explicou que os detritos vão paulatinamente perdendo altitude e, mais cedo ou mais tarde, caem na Terra. Segundo o chefe do laboratório do Inpe, detritos que estão em altitudes baixas caem mais rápido, em meses. Já os mais altos permanecem por décadas. “Quando um satélite é lançado, ele permanece lá por meses ou anos e, ao final da vida útil, é simplesmente desligado. Ao ser desligado, o satélite deixa de ser usado e se transforma em lixo. É como se alguém abandonasse um carro e o deixasse ali. Porém, é viável pegar um carro velho e levar para o pátio. E no caso do satélite não existe um pátio”, compara Souza.
5. É possível ser atingido por um pedaço de satélite, por exemplo?
Essa possibilidade existe, mas a chance de ser atingido é reduzidíssima. Desde o início da corrida espacial, foram inúmeros os registros de quedas de detritos em diversas localidades, como os Estados Unidos, a Austrália e a África. Conforme Souza, porém, muitas vezes o lixo acaba queimando antes de cair na Terra. Quando consegue atravessar a atmosfera, o lixo espacial ainda enfrenta a probabilidade de cair no mar, já que os oceanos ocupam 75% da Terra. “Nunca vai acontecer uma tempestade de lixo espacial, a física não permite isso. É ficção científica”, esclarece o especialista.
6. Na pior das hipóteses, quais são os riscos do acúmulo de lixo espacial?
O cenário mais remoto, porém fisicamente demonstrável, é a Síndrome de Kessler. A hipótese, apresentada por um físico da Nasa, sustenta que haverá um momento em que o espaço terá tantos detritos que será impossível utilizá-lo para as necessidades da humanidade. Isso porque, quando dois objetos se chocam, eles geram mais fragmentos, multiplicando assim o número de elementos em órbita. “Isso lembra uma reação em cadeia, em que choques vão gerando choques e mais choques, como se quase tudo que estivesse em orbita criaria um cinturão e inviabilizaria completamente o uso do espaço”, diz Souza.
7. Na prática, como os detritos espaciais poderiam afetar a vida do homem?
Para a saúde do planeta Terra, o lixo espacial não tem a menor importância, já que representa uma quantidade de massa insignificante, segundo explicou o chefe do laboratório do Inpe. A grande afetada, caso o espaço fosse inutilizado, seria a sociedade. Os satélites que atualmente estão em órbita, por exemplo, são responsáveis por transmitir dados, sinais de televisão, rádio e telefone, sem contar os equipamentos que observam a Terra, fornecem informações sobre mudanças climáticas, podem antecipar fenômenos naturais e fazer o mapeamento de áreas. “O grande problema do lixo espacial está lá em cima: é a probabilidade desses fragmentos danificarem equipamentos necessários para o homem”, explicou o especialista brasileiro.
8. É possível fazer uma “faxina espacial”?
“Limpar o espaço não é como limpar um terreno baldio. Não existe tecnologia para remover esses objetos em órbita, porque a limpeza não é viável”, diz Petrônio Noronha de Souza. Ele explica que a tecnologia não existe de fato - há apenas algumas idéias. A concretização desses métodos, contudo, exige um gasto tão astronômico que a viabilidade técnica acaba sendo questionada.
9. Quais métodos já foram apresentados?
A seguir, algumas das formas já propostas para tentar tirar o lixo do espaço:
Redes: Sistema de redes gigantes, que formaria um cesto capaz de capturar os detritos e jogá-los mais para baixo.
Lasers: Instalar canhões de laser em alguns pontos estratégicos e disparar contra o lixo, para desviar sua órbita para mais perto do planeta. Com isso, o lixo queimaria até desaparecer.
Fios: Cabos condutores de cobre poderiam ser acoplados a satélites desativados para que eles pudessem ser atraídos pelo campo magnético da Terra.
Espuma: Um painel de espuma seria colocado na rota dos detritos. Assim que os objetos passassem por ele, teriam sua velocidade reduzida, caindo de volta no planeta.
Braço: Uma espécie de nave não-tripulada, guiada por radares e câmeras, seria equipada com braços robóticos para coletar os detritos.
10. Há alguma alternativa para evitar que os satélites que estão em órbita não se tornem lixo espacial?
Sim. O chefe do laboratório do Inpe explica que, para evitar que as centenas de satélites em atividade se transformem em lixo espacial ao fim de suas atividades, é preciso programá-los para que eles sigam em direção às chamadas órbitas-cemitério. Assim, os satélites ficariam em lugares bem distantes da Terra, sem oferecer riscos de colisões. De acordo com a Nasa, a cada ano, cerca de 200 pedaços de lixo espacial com mais de 10 centímetros entram no espaço.
11. Por que o uso das órbitas-cemitério não é tão comum?
Muitas vezes isso não ocorre por razões financeiras. De acordo com Souza, um satélite é projetado para permanecer em órbita por cerca de quatro anos. Retirá-lo de lá antes de se auto-desligar para movê-lo em direção a outro lugar significa interromper um trabalho que custa caro. Se a empresa demora muito, acaba ficando tarde demais. Souza explica que, ultimamente, as operadoras de telecomunicações, que possuem posições orbitais muito bem determinadas, têm se interessado em alterar a rota para as órbitas-cemitério. Isso ocorre porque, se o satélite continuar no mesmo local, pode vir a atrapalhar a instalação de um novo.
12. As agências espaciais se preocupam com esse tema?
A maioria das organizações possui um núcleo para tratar de assuntos relacionados ao lixo espacial. Em 1986, a ESA, agência espacial europeia, criou um grupo para analisar e estudar os detritos no espaço. Neste ano, a ESA investiu 64 milhões de dólares em um programa chamado Conscientização da Situação Espacial. Já a Nasa criou, em 1997, o Centro de Estudos de Órbita e Re-entrada de Destroços. Além dessas, há também a Inter-Agency Space Debris Coordination Committee (IADC), que se propõe a ser um órgão internacional que coordena atividades relacionadas a assuntos ligados ao lixo espacial. O IADC agrega agências espaciais de países como Alemanha, Índia, China e Japão. As organizações costumam recomendar práticas ideais, mas que dificilmente são adotadas, já que não são imposições legais. “As organizações não têm força de lei. Somente fazem sugestões que as nações adotam ou não”, explica Souza.
13. O Brasil também tem sua parte de responsabilidade na “poluição do espaço”?
Segundo Souza, o Brasil possui dois satélites de coleta de dados e mais três satélites em conjunto com a China. “Nenhum desses cinco dispõe de um sistema para que seja feita sua remoção em órbita. Por isso, o Brasil não pode se eximir.”
FONTE: Nasa, Via, Apollo XI, Revista Veja.
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